quarta-feira, 26 de março de 2008

CADA UM PENSA COMO PODE

Reflexões sobre eu e o álcool, 4

Querido Alberto. Comecei respondendo ao seu instigante comentário ao meu post ASSIM SOU SE LHE PAREÇO, que “beber tem que ser sempre uma opção; coagir o outro a qualquer ato é imoral”, e quando me dou conta – escrevi todo um novo post.

Para beber, não me sinto objeto de coação – mas sim de uma expectativa fuerte. Para algumas pessoas, como disse o Alê Bom à Bessa (ouch!), não beber é uma ofensa. Mas a expectativa fuerte do outro é problema dele, não? O meu problema é não me deixar levar por ela. Mas isso às vezes, humph, é um trabalho em tempo integral.

Ah, algumas pessoas tendem a levar as coisas para o lado pessoal, como se diz. Por exemplo, algumas levam o fato de eu ser vegetariana para o lado pessoal. Mais: Consideram-no uma ofensa. E, diante dessa ofensa, tratam logo de retribuí-la. Já ouvi que compadecer da dor dos animais é uma frivolidade – que é mais típico de quem não se compadece da dor dos seres humanos. E que compadecer da dor de mamíferos, peixes e aves é uma hipocrisia. E a dor dos vegetais que eu como? Ou a dor dos insetos que são mortos no cultivo daquilo que eu como? Ou a dor dos germes que são mortos na lavagem da louça em que eu como? E tudo isso porque eu digo, não, obrigada, não quero ir a uma churrascaria com você. Falo sério.

Mas o que será isso? A expressão trágica, como diria Marshall B. Rosenberg, criador da comunicação não-violenta, de uma necessidade não atendida? E que necessidade será essa? Que eu o acompanhe a uma churrascaria? Que eu sempre lhe diga sim? Que eu retribua a lealdade que ele me dedica? Que eu retribua as concessões que ele faz por mim? E porque não falar isso assim, como é – ao invés de usar o meu vegetarianismo para me chamar de frívola ou hipócrita?

Eu e um baiano, que mora em São Paulo, ficamos meses sem nos falar. Daí uma hora ele me liga e diz: Estou passando agora na sua casa, estou morrendo de saudades. Então eu explico que já tenho outros planos, e proponho que nos encontremos num outro dia. Não sei bem como, ele sempre acha uma forma de me dizer que para mim tudo tem que ser hipermontado e hiperformal, que uma amiga de verdade sempre arruma tempo para um amigo, que eu corto toda uma energia maravilhoo-sa de improvisação, que eu sou assim – uma paulista! Miau.

Talvez eu, o churrasco-lover e o baiano estejamos, cada um a seu modo, tentando lidar com a dor de receber um não. Porque essas críticas tão duras também me chegam como um não: Um não ao meu estilo de vida, um não às minhas escolhas. Há alguns anos era-me muito doloroso ouvir críticas tão duras. Tão doloroso que eu logo transformava o meu não num sim – para não ter que ouvir nem mais uma daquelas palavras. Hoje ainda é doloroso ouvir algo assim – mas não o suficiente para eu abrir mão do meu não. Então eu respondo que eu preferiria que eles me achassem uma fofa. Mas que, parafraseando Luigi Pirandello, eu sou aquilo que lhes pareço. Ou que, repetindo Mário Quintana, cada um pensa como pode. Grr.

Em empatia a todas as pessoas que conhecem a dor de receber um não, deixo-os com a abertura de Magnolia, do muito talentoso (e muito sexy) P.T. Anderson, ao som de One, da muito talentosa (e muito melancólica) Aimee Mann. Nessa abertura, todos os personagens são-nos introduzidos assim, de uma vez só. Não sabemos o que os une – mas a canção sugere experiências de solidão e de não: No is the saddest experience you'll ever know. Yes, it's the saddest experience you'll ever know. Because one is the loneliest number that'll you'll ever do. Aqui você encontra uma versão de One sem a interferência do som do filme.

6 comentários:

Too-Tsie disse...

Oi Lu Lux!
Acho que receber um não é tão difícil quanto dizer.
Ainda mais de/para pessoas queridas.

Puxa, fiquei um pouco sentido com a acusação do seu amigo baiano. Mas seja firme no seu não, nossas vontades devem prevalecer sempre, amigo que é amigo, entende o não do amigo.

Adoro o filme, vontade de ver de novo.

Douglas Mendez- O Homem é um ilha disse...

Oi, Lu
Vou responder sobre o tango por aqui:
te confesso que no começo eu ficava mesmo era olhando pro meu pé, depois que ficando mais confiante olhei o tempo todo pra minha parceira, mas vou descobrir se posso ou não olhar em ela. Em breve te convido pra uma dança, abs

Daniel disse...

Oi Lucia,
Obrigado pela visita e pelo post. Passando para agradecer.
Beijos mil
Dan
www.sembolso.blogspot.com

Alexandre Lucas disse...

Já deu esse papo sobre álcool, né? Hehehehe. Cada um faz, bebe, ama, evita o que gosta e como gosta e deve respeitar o mesmo direito nos outros. Beijos e saudades que nosso último encofoi meio zás-trás!
=)

Alberto Pereira Jr. disse...

relendo meu comentário me senti uma velhinha carcumida de 200 anos.. hehehe.. mas mantenho minha opinião e concordo plenamente com vc.. não gostamos de ouvir negativas.. e ao invés de aceitá-las colocamos no outro o motivo de tal recusa.

beijao Lu

ps: Magnolia é um filme excepcional

Anônimo disse...

Obrigado por este destacamento, foi bastante útil e disse um monte