sexta-feira, 16 de maio de 2008

RUN, LÚCIA, RUN 2

Verão de 2008. Uma amiga conta-me que ficou com um bonitão num cruzeiro de navio. Não o meu cruzeiro; outro. Envolve-se. De volta à terra firme, encontra o seu perfil orkut. Relacionamento: “Namorando”. Sniff. O que não suporto: “Mentira e traição”. Quê? Com os relacionamentos anteriores aprendi: “Que prefiro as dores da verdade às flores de mentira”. Grrr. Comunidades: “Confiança é igual virgindade”. “Fidelidade é tudo”. “Amo tudo em minha namorada”. “A verdade dói, a mentira mata”. *&%$@#!

Mentira, hipocrisia, falta de caráter, personalidade borderline? “O que você acha?”, ela me pergunta.

Faltou-me, agora me dou conta, a presença que a empatia requer. Ponho-me a fazer, bem, uma análise dessa faceta da condição humana. Por vezes, eu argumento, as pessoas identificam-se com virtudes ou hábitos que admiram – mesmo que lhes faltem. Veja o orkut. Conheço pessoas filiadas à comunidade “Adoro ler livros” que estariam melhor representadas numa comunidade “Um dia ainda termino de ler um livro”. Haveria mais honestidade se os membros de “Odeio mentira” que eu conheço migrassem para “Odeio que mintam para mim”. “Inteligência é afrodisíaca”? Os afiliados que eu conheço encontrariam mais ressonância em “Beleza e poder (mesmo em pessoas burras e superficiais) são afrodisíacos”.

Propaganda enganosa? Não, eu continuo, não necessariamente. Talvez essas pessoas estejam buscando as virtudes ou os hábitos que admiram e que lhes faltam. Talvez elas o estejam fazendo cercando-se da energia dessas virtudes ou desses hábitos – não é essa a idéia dos mantras, da programação neurolingüística? De O Segredo? Dos Vigilantes do Peso? Dos Alcoólicos Anônimos?

Mmm.

Olhemos o meu perfil no orkut, sugiro. Ao participar da comunidade “A Loca”, eu digo “seria incrível ter a energia de ir à Loca todos os domingos – o que não tenho há mais de um ano”. “CB Bar”? “Seria incrível ter a energia de ir ao CB todos os sábados – o que só tive uma vez”. “Iranian Cinema”? “Amei ter assistido a quatro filmes iranianos – o último deles, À Caminho de Kandahar, há sete anos”. Ela se anima. Com a minha filiação à comunidade “Run!”, ela argumenta, eu quero dizer “eu corro de quem me convida para correr.”

Epa! Alto lá! O que está acontecendo aqui, BHY? Só eu posso falar dos meus vícios com toda essa leveza e humor. Ah, não!, eu intervenho. Com “Run!” quero dizer “correr me faz bem, em breve voltarei a correr”.

Silêncio.

2 comentários:

Jackson Morais disse...

Silêncio em (muito) respeito ao que você escreve. Perfeito!
;-)

Alberto Pereira Jr. disse...

pequenas ou grandes, mentiras parecem ser combustíveis da humanidade. engraçado, mas dizer que não mentimos já é uma mentira.. mesmo assim manter a sinceridade ao máximo e não falsear qualidades, gostos e realidade (o que seria real?) é uma arte.. e buscá-la é preciso